quarta-feira, junho 22, 2011


Perdida e salva

Tentativas vãs de descrever o que me calou
Me roubou palavras e chão e ar
Me roubou de mim
E a dor some no vazio que o seu beijo preencheu
Da flor somem os espinhos
É assim o mundo que você me deu...
Não há
Sensação melhor
Não há
Sinto estar
Perdida e salva

Tentativas vãs de libertar
O sentido maior que as palavras prenderam
Quando eu disse: amo você
Em lugar de mil palavras, deixa o instinto se exercer
Deixa o íntimo silêncio percorrer só.

Apesar de ser tão claro eu não consigo entender
E apesar de ser tão imenso cabe em mim
O mundo que você me deu

Não há
Sensação melhor, não há
Sinto estar: perdida e salva


***
Porta-vozes do não dito

É natural reconhercemos fragmentos de nós dispersos em letras de canções, excertos de poemas... Parece que emprestaram os deuses a alguns seres humanos o doce dom de dizer por aqueles que se silenciam, como porta-vozes do não dito. Essa letra da Sandy, por exemplo, me descreve tb.
Eis que vivo na corda bamba de uma paradoxo: perdida e salva. E o pior... não sei como coube em mim o mundo incoerente que me deu... E vivo assim: na dor some todo o vazio que sua beijo preencheu... na flor somem os espinhos.

E a corda? Bamba... e firme como as linhas retas de uma folha de caderno. Eu não caio. E ninguém me pergunte o porquê pois os meus porque's já se esgotaram (Tantos os das perguntas quanto os das possíveis respostas). Os meus motivos pra suportar essa disparidade consomem-se e renascem de si mesmos como Fênix. Drummond, para consolo dos inquietos, diria: Existem mil motivos para se odiar uma pessoa, e uma só para amá-la. Pois... escrevo, porque as letras sao meu corrimão (=apoio, ponto de um fragil equilíbrio).
Mi-com sono e sem mais para o "doce" momento.




"Podia ser só amizade, paixão, carinho, admiração,
 respeito, ternura, tesão.
Com tantos sentimentos arrumados cuidadosamente
na prateleira de cima,
tinha de ser justo amor, meu Deus?"

Caio Fernando Abreu.

terça-feira, junho 21, 2011


Borboletando pelos jardins alheios

Borboletando pelas páginas de blogues alheios, li um fragmento de Vinícius de Moraes que diz assim: "Nada melhor para a saúde que amar um amor correspondido". Lembrei daquele filme Mouling Rouge, visto no cinema, no Rio, há anos. Tb o vi na facul... Volta e meia os Telecines veiculavam tb. Adoro esse musical. O protagonista costuma dizer uma frase semelhante a do poeta brasileiro exímio em kit D. Juan. 
Um desfile de cenas mentais passam pela minha cabeça. Demonstrações dele de afeto, carinho, ternura, desejo... tudo isso desencadeia efeitos de um enorme bem-estar no coração. Relembro as músicas bem breguinhas românticas que ouvia na adolescência, as do Roupa (todas conhecidas do meu coração) surgem como estrofes de poemas que ainda recito de cor, e nem sabia... Por onde anda o RN que nem penso mais neles? Foram "amigos" queridos, e valiam a pena as filas enormes de camarim, as idas aos longíncuos hoteis para conversas bobas... Não sinto saudades, porém. Lá para trás ficaram.

Mas quanto ao bem-estar no coração...
De repente, as dificuldades tornam-se maleáveis, ganho um novo fôlego pra tudo. No rádio, toca aquela cançãozinha brega do Luan Santana Amar não é pecado, e se eu estiver errado que se dane o mundo eu só quero você.
Rio em solêncio...
E me apego ás palavras de Pessoa, como quem olha pros lados e tenta achar, no mundo adulto, alguém ilustre, com respaldo, que tenha se sentido ridículo como eu, e me diga que não estou sozinha em estado de graça assim. Eis que lembro do poeta português quando sabiamente diz Todas as cartas de amor são ridículas!
Pois, então... Se Pessoa pode, tb me atrevo à sensação ridiculamente poética, sob os efeitos entorpecentes do amor.
Mi*


***

Textinho da Caio Fernando Abreu. Vale a pena ler...

Posso não saber nada do coração das gentes, mas tenho a impressão, de que, de tudo, o pior é quando entra a segunda parte da letra de "atrás da porta", ali no quando "dei pra maldizer o nosso lar pra sujar teu nome, te humilhar". Chico Buarque é ótimo pra essas coisas. Billie Holiday é ótimo pra essas coisas. E Drummond quando ensina que "o amor, caro colega, esse não consola nunca de núncaras."

Aí você saca que toda música, toda letra, todo poema, todo filme, toda peça, todo papo, todo romance, tudo e todos o tempo todo, antes, agora e depois, falam disso. Que o que você sente é único e indivisível e é exatamente igual à dor coletiva, da Rocinha a Biarritz.

O coro de anjos de Antunes Filho levanta no ar, em triunfo, os corpos mortos de Romeu e Julieta enquanto os Beatles pedem um Litlle Help from my friends, e a plateia ainda aplaude e pede bis (O Gonzaguinha também é ótimo pra essas coisas). 

Se é patologia, invenção cristã-judaico-ocidental-capitalista, ou maya, ego, se é babaquice, piração, se mudou através-dos-tempos, puro sexo, carência, medo da morte: não interessa. Tenho certeza que já estive lá, naquele terreno. Ele existe. (...) O que quero dizer é justamente o que estou dizendo Não estou com pena de mim. Tá tudo bem. Tenho tomado banho, cortado as unhas, escovado os dentes, bebido leite. Meu coração continua batendo - taquicardiaco, como sempre. Dá licença, Bob Dylan: It´s all right man, I´m just bleeding. Tá limpo. Sem ironias. Sem engano.

Amanhã, depois, acontece de novo, não fecho nada, continuamos vivos e atrás da felicidade, a próxima vez vai ser ainda quem sabe mais celestial que desta, mais infernal também, pode ser, deixa pintar. Se tiver aprendido lições (amor é pedagógico?), até aproveito e não faço tanta besteira.

Mas acho que amor não é cursinho pré-vestibular. Ninguém encontra seu nome no listão dos aprovados. A gente só fica assim. Parado olhando a medida do Bonfim no pulso esquerdo, lado do coração e pensando, pois é, vejam só, não me valeu."

sexta-feira, junho 17, 2011


Bom dia, vida!


A luz despiu seu cobertor
Bom dia, vida!
O meu corpo amanheceu
Com uma alegria menina!
Bom dia, bom dia!
Abro a janela ao convite
De um coral de passarinho.
Um sol cor de riso me veste
Da cabeça até os pés.
Respiro o aroma de terra,
Cheiro de orvalho e café.
Bom dia, bom dia!
Dia bom de colher flores
E um ramalhete de amores…
Bom dia, vida,
Bom dia!
Ilka Brunhilde. Brincando de amor. São Paulo: Moderna, 2003.


P.S. Poeminha para decorar e declamar ao namorado pela manhã. Genuíno, doce, quase infantil!...




A verdade do encontro

Os outros, eu conheci por ocioso acaso.
A ti, vim encontrar porque era preciso.
(Guimarães Rosa).





Câmera:
a nova contadora de histórias da contemporaneidade


Ver novelas fez ou faz parte da rotina de muitos brasileiros. As meninas crescem vendo as tramas, emocionando-se com as histórias complicadas dos casais. Mas de todas as narrativas visíveis que nos fizeram companhia nas horas ociosas, nenhuma foi melhor, mais bem tramada, mais bonita do que “O clone”. E falo com o olhar de quem foi e veio pelos meandros de literaturas sérias e engajadas. Falo com propriedade.

Geralmente, as novelas, claro, são veiculadas com fins comerciais: vendas de produto através de entretenimento. Por vezes, esse produto pode ser uma ideia, um comportamento, uma nova ou antiga visão. É uma receita que funciona. Nessas narrativas, o foco dado pela voz-câmera é veriado, de modo que fica difícil saber quem são os protagonistas. Nesta, não.
Os personagens principais não são confundidos facilmente. Vê-se que a história gravita em torno dos dois que se escolheram, mas adiam demasiado a união definitiva devido a dilemas comuns á humanidade: dúvidas juvenis e inseguranças (Lucas); submissão forçada por uma cultura patriarcalista em que a mulher é vista como tendenciosa ao pecado (Jade). É o mito de Eva que se eterniza...
'"Engraçado" ver como a protagonista, amiúde, surge acuada como um bicho: presa no quarto, presa na casa, presa do lado de fora da casa, vagando com a mala na mão, fugindo em ruínas com a pequena nos braços. Sempre diante dos ditames de uma religião déspota, inadaptável aos avanços da humanidade. A opressão feminina sobrevive, se desenrola anos a fio, pois veem a mulher como uma mera procriadora (Quanto primitivismo, meu Deus!)

A escolha das palavras e expressões, a trilha sonora, a edição, foi tudo muito bonito. Penso que foi feita por milhares de mãos, como as de quem constroem castelos de sonhos. O diretor expôs claramente os paralelos entre os personagens, exibindo imagens que quando não se contrapõem, se somam como nuanças bem definidas de cores. Quando se veem imagens da vida de um, episódios da vida do outro são emparelhados, revelando caminhos opostos, mas unidos pelo olhar da câmera-narradora que não hesita mostrar também os encontros e reencontros de J. e L.

Vejo todos os dias (de novo). Foi uma história que mexeu comigo no final da minha adolescência... Ver uma mulher emparedada pelo Amor e ódio desenfreados de um homem machucado pelo desamor (Said), subjugada pela religião hostil, fragilizada pelos limites impostos, sedenta pela liberdade de viver com um homem (agonizante tb) que vem e vai. Um amor escolhido do seu próprio coração mas que não o pode viver... tudo isso nos faz refletir sobre a nossa cultura e valorizá-la mais (Amo meu brasil! Como é bom ser mulher aqui, no século XXI, num país livre [livre até demais?]).


Enfim!...
Isso, claro, desperta emoções e sentimentos. É uma delícia reviver essa história. Em cada abraço de reencontro, vejo uma identificação com todas nós que amamos, e aguardamos, ardentemente, o cálido afago dos nossos namorados que vivem longe, que vão para longe...
Em qualquer época da jornada do ser humano, todos nós de sociedades atuais ou antigas adoramos ver, sentir e ouvir uma boa e bem contada! história. Isso ninguém pode negar...
Mi.

sexta-feira, junho 10, 2011



Adoro versos livres.
Posto um com o qual acabei de trabalhar.
Tem a ver com meu momento...
Tu-do!

***

Receita para curar (...)

Chore um mar inteiro
com todos os seus barcos a vela
Chore o céu e suas estrelas
os seus mistérios, o seu silêncio…
Chore um equilibrista caminhando
sobre a face de um poema.
Chore o sol e a lua,
a chuva e o vento

Para que uma nova semente
entre pela janela adentro.

Roseana Murray.